Publicado originalmente em Portal Refil
Se em Ainda Estou Aqui o diretor Walter Salles tenta universalizar a experiência de ter uma família dilacerada por um regime autoritário, o documentário Yõg Ãtak: Meu Pai, Kaiowá, que estreia nesta quinta-feira (10 de julho), traz à tona o fato de que ainda não temos a real dimensão da Ditadura Militar e de todos os tipos de separação que ela nos causou.
No longa (distribuído por Embaúba Filmes), Sueli Maxakali, uma das diretoras, retrata seu reencontro com o pai, quarenta anos após terem sido separados pelo regime militar.
A partir dos passos para encontrar seu pai, Luiz Kaiowá, Sueli entrevista amigos e parentes mais velhos que rememoram como os militares chegavam às terras, o tratamento dado aos indígenas, o tipo de trabalho que eram obrigados a fazer e como eram arrancados de suas comunidades quando ainda eram crianças.
A trajetória de Luiz Kaiowá nos serve de exemplo: ele sai do território de Ka’aguyrusu, no Mato Grosso do Sul, no início dos anos 1960, junto com outros parentes. Passa por São Paulo e Rio de Janeiro, até ser levado à força por agentes da Funai para Minas Gerais, onde viveu entre os Tikmũ’ũn (Maxakali) por quinze anos, período em que a diretora e sua irmã Maiza nasceram. Quando Sueli tinha dois meses de idade, Luiz foi reconduzido ao Mato Grosso do Sul e nunca mais voltou.
Agora, quarenta anos depois – já casada e com filhos e netos – Sueli consegue, a partir da internet, descobrir o paradeiro do pai e percorrer os quase mil e oitocentos quilômetros entre a Aldeia-Escola-Floresta, em Minas Gerais, até as Terras Indígenas (TIs) Panambi-Lagoa Rica, Panambizinho e Laranjeira Ñanderu, no Mato Grosso do Sul, reencontrando o pai, agora um dos xamãs de seu povo.
O documentário nos revela mais do que a simples busca de uma filha por seu pai: traz a afirmação de uma ancestralidade negada por um Estado autoritário no passado e negligente no presente.