Diário do Possível #015 – ou quando Doctor Who encontra a Literatura

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Todo podcast tem coisas que são citadas de forma recorrente: piadas internas, acontecimentos engraçados ou o fanatismo de algum integrante por determinado assunto. Se você escuta o podcast Livros em Cartaz possivelmente já deve ter me ouvido falar de Doctor Who por lá.

Aproveitando que a produção da BBC completa 60 anos, fiz uma lista de vezes que o Doutor encontrou autores reais ou que seus roteiristas escreveram alguma história inspirados pela Literatura.

Para quem não conhece a série, ela tem uma premissa simples: O Doutor — sim, esse é o nome dele — é um timelord nascido no planeta Gallifrey que viaja no tempo e espaço em sua TARDIS, a espaçonave com forma de uma cabine telefônica da polícia dos anos 60, sempre assistido por um de seus companions, acompanhantes que podem ser desde terrestres como eu e você até um cachorro robô como o K9.

A forma que os timelords encontraram de enganar a morte foi a regeneração: quando estão a ponto de morrer, eles se regeneram em outra forma. Isso explica o número de atores que viveram a personagem e seu número crescente de encarnações.

Agora que você já sabe o básico de Doctor Who, vamos dar uma olhada na lista?

[AUDIODRAMA] Frostfire — Doutor encontra Jane Austen

Assim como Star Trek e Star Wars, Doctor Who tem seu universo expandido em outras mídias e suportes como livros, HQs e audiodramas. Em 2007, a publicadora Big Finish lançou uma nova aventura do Primeiro Doutor — vivido na série nos anos de 1960 por William Hartnell — em que ele vai parar na Inglaterra Regencial. Sua companion Vicky — narradora da história — desmaia quando chega perto de um artefato (um ovo de fênix, pelo que descobrimos depois) sendo acudida por ninguém mais, ninguém menos que Jane Austen que acaba os ajudando a desvendar o motivo de Londres estar mais fria que o normal.

[S22E11] Timelash, roteiro de Glen McCoy (Episódio duplo) — Doutor encontra H.G. Wells

Infelizmente não poderia falar desse encontro sem spoilers! Ainda na chamada Era Clássica — que compreende as temporadas anteriores a retomada de 2005 — um jovem chamado Hebert está de férias quando acha que sua evocação mágica traz ao seu encontro o Doutor, aqui vivido por Colin Baker. Dividida em dois episódios, somos apresentados ao irritante pioneiro da Ficção Científica e o primeiro a escrever sobre uma máquina que viaja no tempo, H. G. Wells (Herbert George Wells), porém só descobrimos sua identidade no final.

[S01E03] The Unquiet Dead, roteiro de Mark Gatiss — Doutor encontra Charles Dickens

Chegamos a Era Moderna e o encontro não poderia ser melhor! O Doutor (Christopher Ecleston) leva sua nova companion, Rose Tyler, para a Inglaterra Vitoriana na qual encontram um Charles Dickens, já cansado de suas apresentações públicas, que se depara com mortos de uma funerária que não querem se manter dentro de seus caixões.

[S02E04] The Girl in the Fireplace, roteiro de Steven Moffat — Doutor encontra Madame de Pompador

Não, Reinette Poisson, a Madame de Pompador, não era escritora e sim a amante do Rei Luís XV, mas o roteiro deste episódio é baseado no romance A mulher do viajante no tempo, escrito por Audrey Niffenegger. Nesse episódio o Doutor, vivido por David Tennant, tenta entender por que tripulantes-robôs de uma nave estão abrindo janelas do tempo ao redor da vida da Madame de Pompador, enquanto ele próprio se apaixona pela marquesa.

Também vale pontuar que o roteirista deste episódio — que viria a se tornar showrunner da série mais tarde, o Steven Moffat — em 2002 adaptou o mesmo livro em uma produção homônima para a HBO Max que teve apenas uma temporada.

The Girl in the Fireplace é, sem sombra de dúvidas, o meu episódio favorito de toda a série por um motivo muito simples: as soluções que Moffat encontra para falar de assuntos que não são de “censura livre” são engenhosamente deliciosos!

[S03E02] The Shakespeare Code roteiro de Gareth Roberts — Doutor encontra William Shakespeare

O Doutor ainda não tinha encontrado Shakespeare? Tinha, mas só cruzado com ele no especial de 1965 (The Chase). Aqui, na primeira viagem de Martha Jones com o Doutor, a TARDIS os leva para a Inglaterra Elizabetana onde o Bardo é utilizado como instrumento de bruxaria ao escrever Love’s Labour’s Won, uma suposta peça perdida do autor.

Também é nesse episódio que descobrimos a raiva que Elizabeth I tem do Doutor. O motivo, que é hilário, só entendemos no episódio especial de 50 anos da série, The Day of the Doctor.

[S04E07] The Unicorn and The Wasp, roteiro de Gareth Roberts — Doutor encontra Agatha Christie

Se The Girl in the Fireplace é meu episódio favorito, Donna Noble, vivida por Catherine Tate, é minha companion favorita. Neste episódio ela e o Doutor encontram Agatha Christie em uma das passagens mais curiosas da biografia da autora: em 1926, ela desaparece misteriosamente, apenas para ser encontrada dez dias depois no Harrogate Hotel, sem nenhuma lembrança do que aconteceu. Se você quiser saber o que envolve esse mistério, pode escutar o primeiro episódio do Livros em Cartaz, mas advirto que a realidade não é tão divertida quanto a narrativa criada por Gareth Roberts.

[S12E08] The Haunting Of Villa Diodati, roteiro de Maxine Alderton — Doutora encontra John Polidori, Mary Wollstonecraft Godwin, Percy Shelley e Lord Byron

A ideia inicial de Frankenstein foi concebida em uma noite em que amigos, sem outra coisa para fazer, criam uma disputa para saber quem escreveria a melhor história de fantasmas. É esse acontecimento que levará a Doutora — vivida por Jodie Whittaker — e seus companions a entender que talvez as coisas não tenham acontecido exatamente como dizem as lendas…

Ao final da lista, sei o que você está pensando e, sim, para um viajante, que pode ir para onde quiser, o Doutor passa muito tempo na Inglaterra.

Criada pela BBC como uma forma de ensinar História para o público infanto-juvenil, Doctor Who ultrapassou fronteiras, apesar das primeiras temporadas da retomada — em 2005 — terem o orçamento que compraria um picolé e uma paçoca Amor. Só posso acreditar que gosto da série por causa de narrativa infalível e, principalmente, pelo carisma do protagonista, que se vale de tantos rostos quanto de personalidades e que, mesmo assim, é único, é o Doutor.

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